domingo, 13 de junho de 2010

Confrontos étnicos matam 113 no Quirguistão, na pior onda de violência em 20 anos




A Rússia mandou 150 paraquedistas ao Quirguistão neste domingo para proteger suas bases militares, no momento em que os confrontos étnicos se espalham pelo país do centro da Ásia, elevando o número de mortos para 113 neste quarto dia de violência.

O Ministério da Saúde disse que 92 pessoas foram mortas em Och e 21 em Jalalabad, e 1.045 ficaram feridas. Ao menos cinco policiais morreram, segundo o Ministério do Interior. Autoridades médicas afirmam que o número de mortos pode aumentar drasticamente, já que muitas pessoas de etnia uzbeque têm medo e não procuram ajuda médica.

Os ataques de grupos de etnia quirguiz contra bairros de etnia uzbeque deixaram cidades em chamas e levaram milhares de uzbeques a deixar o país e cruzar a fronteira rumo ao Uzbequistão. A agência de notícias russa RIA informou que até 75 mil refugiados podem ter cruzado a fronteira.

É o pior incidente étnico no Quirguistão desde 1990, quando o então líder do Kremlin Mikhail Gorbachov mandou soldados soviéticos para Och após centenas de pessoas serem mortas numa disputa de terras.

É também o momento mais violento desde que o ex-presidente Kurmanbek Bakiev foi deposto em um levante violento em abril, sendo substituído por um governo interino.

A presidente interina, Roza Otunbaieva, acusou os apoiadores de Bakiev de incitar o conflito étnico por motivos políticos. Os uzbeques apoiaram o governo interino, enquanto muitos quirguizes no sul apoiaram o governo deposto.

Do exílio em Belarus, Bakiev divulgou um comunicado classificando as acusações de "mentiras sem vergonha" e acusou o governo interino de não conseguir proteger o povo.

Confrontos

O governo interino liderado por Roza Otunbaieva mandou uma força voluntária para o sul do país e determinou neste sábado que as forças de segurança do país podem atirar para matar para conter os confrontos étnicos.

A violência começou em Och no final da quinta-feira (10), antes de chegar até Jalalabad, a cerca de 70 quilômetros. Apesar de as pessoas de etnia uzbeque representarem apenas 14,5% da população do Quirguistão, a porcentagem entre uzbeques e quirguizes é mais equilibrada nas regiões dessas duas cidades.

A situação piorou na região de Jalalabad, que se tornou o "centro das forças de instabilidade", disse o porta-voz do governo, Farid Niazov.

Homens armados atiraram contra bombeiros tentando apagar um incêndio na Universidade de Amizade dos Povos, comandada por uzbeques, ferindo um motorista, segundo o porta-voz do Ministério de Emergências, Sultan Mamatov.

Uzbeques armados com rifles de caça improvisaram barricadas tentando se proteger de grupos quirguizes armados com rifles automáticos.

Polícias e soldados pareciam estar na defensiva, evitando choque com os grupos armados. Os voos para Och e Jalalabad foram cancelados e os aeroportos, fechados.

Genocídio

Na segunda maior cidade do país, Och, os uzbeques disseram que grupos estavam praticando "genocídio" ao queimar casas e tentar atirar nos moradores quando eles tentavam fugir. Testemunhas viram corpos caídos nas ruas.

"Deus nos ajude! Eles estão matando uzbeques como animais. Quase a cidade toda está em chamas", disse por telefone Dilmurad Ishanov, funcionário de direitos humanos de etnia uzbeque.

Ativistas de direitos humanos acusaram as autoridades de não conseguir conter a violência e de se juntarem aos quirguizes. "Moradores estão nos ligando e dizendo que os soldados estão atirando neles", disse o ex-vice parlamentar Alisher Sabirov, voluntário em Och.

Refugiados

Milhares de mulheres e crianças cruzaram a fronteira em direção ao Uzbequistão. Cholponbek Turuzbekov, vice-comandante do serviço de fronteira quirguiz, disse que as autoridades uzbeques mandaram fechar a fronteira.

A agência de notícias russa RIA citou uma autoridade anônima dizendo que uma autoridade do Ministério de Emergência do Uzbequistão afirmou que 75 mil refugiados podem ter cruzado a fronteira. Uma autoridade da Cruz Vermelha disse que o número deve ser bem menor, mas provavelmente na casa dos milhares.

Uma ativista do Human Rights Watch disse que a maioria dos que fugiram são idosos, mulheres e crianças, enquanto os homens ficaram. "Eles estão ou mortos ou em Och, tentando proteger as casas que ainda não foram incendiadas."

Rússia

O Quirguistão hospedas bases aéreas militares da Rússia e dos EUA, mas elas ficam no norte do país, longe dos confrontos atuais. A Rússia negou o pedido de ajuda militar do governo interino quirguiz, mas mandou reforços hoje para proteger sua base.

Várias unidades de paraquedistas chegaram neste domingo para proteger soldados e famílias na base aérea russa de Kant, no norte do país, informou um porta-voz do Kremlin.

Um porta-voz do Ministério da Defesa disse que 150 paraquedistas armados foram enviados ao Quirguistão, mas a agência de notícias Itar-Tass disse que foram ao menos 300, citando fontes do Ministério.

A presidente interina do Quirguistão pediu neste sábado que a Rússia enviasse soldados para ajudar a conter a violência no sul do país. O apelo foi renovado hoje pelo ministro de Defesa interino, Ismail Isakov, que alegou que as forças especiais russas conseguiriam conter o conflito rapidamente.

No entanto, ontem o Kremlin disse não ver condições para o envio de tropas agora, uma vez que os confrontos são internos, mas ofereceu ajuda humanitária, segundo uma porta-voz do governo russo.

O Kremlin também disse que pretende discutir a situação nesta segunda-feira, dentro de um bloco de ex-repúblicas soviéticas, lideradas por Moscou, chamado Organização do Tratado de Segurança Coletiva (OTSC).

Reações

O secretário-geral da ONU (Organização das Nações Unidas), Ban Ki-moon, disse estar alarmado pela escala dos confrontos e ordenou a viagem de um enviado especial à capital quirguiz, Bishkek, segundo comunicado.

A Cruz Vermelha disse que a situação humanitária no sul do Quirguistão "está se tornando crítica". "Estamos recebendo registros de várias brutalidades, com intenção de matar", afirmou em comunicado.

A embaixada dos EUA no Quirguistão disse em comunicado estar em conversas com o governo interino para fornecer ajuda humanitária, e pediu a "imediata restauração da ordem".

Um porta-voz do Pentágono disse que o governo interino quirguiz não pediu ajuda militar aos EUA.

O chanceler do Uzbequistão condenou os ataques e disse ter esperança quanto ao restabelecimento da ordem, mas o autoritário presidente do país, Islam Karimov, não deve interferir no conflito.

Histórico

Tensões políticas entre o sul, predominantemente agrícola, e o norte do Quirguistão existem há um longo período, além de conflitos étnicos e rivalidades entre diferentes clãs.

Dos cerca de 5,3 milhões que vivem no Quirguistão, 69% são de etnia quirquiz, 14,5% são uzbeques e 8,4% são de etnia russa.

No entanto, no sul do país, os uzbeques representam 40% dos cerca de 1 milhão que vivem na área de Jalalabad e cerca de 50% na região de Osh. Os dois grupos étnicos são predominantemente muçulmanos sunitas.

O Quirguistão, que ganhou a independência após o colapso da ex-União Soviética, em 1991, enfrenta grave crise política desde a deposição de Bakiev, em 7 de abril.

Em 19 de maio, duas pessoas morreram e 74 ficaram feridas em confrontos entre quirguizes e uzbeques na cidade de Jalalabad. No mesmo dia, Otunbaieva anunciou que governaria o país até junho de 2011, deixando de lado os planos para eleições presidenciais em outubro.




FONTE: FOLHA ONLINE / DAS AGÊNCIAS DE NOTÍCIAS

Nenhum comentário:

Postar um comentário

DESEJANDO, DEIXE SEU COMENTÁRIO. SERÁ LIDO, COM PRECIOSO ZÊLO E ATENÇÃO. OBRIGADA.