Leia a íntegra da sentença que
condenou Lindemberg Alves
Depois de quatro dias de
julgamento, a juíza Milena Dias proferiu, nesta quinta-feira (16), a sentença
do réu Lindemberg Alves, 25. O motoboy foi condenado pela morte da ex-namorada
Eloá Pimentel, 15, e por outros 11 crimes. A jovem foi mantida refém por cerca
de cem horas em outubro de 2008 em seu apartamento, localizado em um conjunto
habitacional de Santo André (ABC paulista).
Leia a íntegra:
Leia a íntegra:
Vistos.
Dispensado o relatório, nos
termos do artigo 492, do Código de Processo Penal.
Submetido a julgamento nesta
data, o Colendo Conselho de Sentença
reconheceu que o réu LINDEMBERG ALVES FERNANDES praticou o crime de homicídio qualificado pelo motivo torpe e recurso que dificultou a
defesa da vítima (vítima Eloá Cristina Pimentel da Silva), o crime de homicídio
tentado qualificado pelo motivo torpe e
recurso que dificultou a defesa da vítima ( vítima Nayara Rodrigues da Silva),
o crime de homicídio qualificado tentado ( vítima Atos Antonio
Valeriano), cinco crimes de cárcere privado
e quatro crimes de disparo de arma de fogo.
Passo a dosar a pena:
Deve o Magistrado, atrelado a
regras de majoração da pena, aumentá-la até o montante que considerar correto,
tendo em vista as circunstâncias peculiares de cada caso, desde que o faça
fundamentadamente e dentro dos parâmetros legais.
A sociedade, atualmente, espera
que o juiz se liberte do fetichismo da pena mínima, de modo a ajustar o quantum
da sanção e a sua modalidade de acordo com a culpabilidade, os antecedentes, a
conduta social, a personalidade do agente, os motivos, as circunstâncias do
crime, bem como o comportamento da vítima.
Pois bem.
Todas as condutas incriminadas,
atribuídas ao réu e reconhecidas pelo Egrégio Conselho de Sentença incidem no
mesmo juízo de reprovabilidade. Portanto, impõe-se uma única apreciação sobre
as circunstâncias judiciais enunciadas no artigo 59 do Código Penal,
evitando-se assim, repetições desnecessárias.
As circunstâncias judiciais do
artigo 59, do Código Penal, não são totalmente favoráveis ao acusado, razão
pela qual a pena base de cada crime será fixada acima do mínimo legal.
Com efeito, a personalidade e
conduta social apresentadas pelo acusado, bem como as circunstâncias e
consequências dos crimes demonstram conduta que extrapola o dolo normal
previsto nos tipos penais, diferenciando-se dos demais casos similares, o que
reclama reação severa, proporcional e seguramente eficaz. (STF - RT 741/534).
Esta aferição encontra
guarida no princípio da individualização da pena e deve ser realizada em cada
caso concreto (CF/ 88, art.5º XLVI).
Os crimes praticados atingiram o
grau máximo de censurabilidade que a violação da lei penal pode atingir.
Na hipótese vertente, as
circunstâncias delineadas nos autos demonstram que o réu agiu com frieza,
premeditadamente, em razão de orgulho e egoísmo, sob a premissa de que Eloá não
poderia, por vontade própria, terminar o relacionamento amoroso. Tal estado de
espírito do agente constituiu a força que determinou a sua ação.
E, nesse
contexto, envolveu não apenas tal vítima, mas também Nayara, Iago e Vitor,
amigos que a acompanhavam na data em que o acusado invadiu o apartamento.
Durante o cárcere privado, as vítimas, desarmadas e indefesas,permaneceram
subjugadas pelo agente, sob intensa pressão psicológica, a par de agressões
físicas contra todos perpetradas.
Durante a barbárie, o réu deu-se ao
trabalho de, por telefone, dar entrevistas a apresentadores de televisão,
reforçando, assim, seu comportamento audacioso e frieza assustadores.
Lindenberg Alves Fernandes chegou a
pendurar uma camiseta de time de futebol na janela da residência invadida.
Não posso olvidar,
nesse contexto, as consequências no tocante aos familiares das vítimas.
Durante o
cárcere privado, a angústia dos familiares, mormente de Eloá e Nayara, que por
mais tempo permaneceram subjugadas pelo réu, que demonstrava constante
oscilação emocional, agressividade, atingiu patamar insuportável diante da
iminência de morte, tendo por ápice os disparos que foram a causa da morte de
Eloá e das lesões sofridas por Nayara.
E depois
dos fatos, as vítimas Nayara, Victor e
Yago sofreram alterações nas
atividades rotineiras, além de terem de se submeter a tratamentos psicológicos
e psiquiátricos.
Ainda, além de eliminar a vida de
uma jovem de 15 anos de idadee de quase
matar Nayara e o bravo policial militar
Atos Antonio Valeriano, o réu causou enorme transtorno para a comunidade e para
o próprio Estado, que mobilizou grande aparato policial para tentar
demovê-lo de sua bárbara e cruel intenção
criminosa.
Os crimes tiveram enorme
repercussão social e causaram grande comoção na população, estarrecida pelos
dias de horror e pânico que o réu propiciou às indefesas vítimas.
Em suma, a culpabilidade, a
personalidade do réu, seus egoísticos e abjetos motivos, as circunstâncias e
nefastas consequências do crime impõem a esta a Julgadora, para a correta
reprovação e prevenção de outros crimes, a fixação da pena, na primeira fase de
aplicação, em seu patamar máximo cominada para cada delito, ou seja, 30 anos de
reclusão para o crime de homicídio qualificado praticado contra Eloá; 30 anos
para o crime de tentativa de homicídio qualificado praticado contra Nayara; 30
anos para o crime de tentativa de homicídio perpetrado contra a vítima Atos; 05
anos de reclusão para cada crime de cárcere privado (contra Iago, Vitor, Eloá e
Nayara, por duas vezes) e de 04 anos de reclusão e pagamento de 360 (trezentos
e sessenta dias multa) para cada crime
de disparo de arma de fogo (quatro vezes).
Na segunda fase, não incidem
agravantes. Presente a atenuante da confissão espontânea em relação aos crimes de disparo de arma de fogo descritos
nas nona e décima séries e cárcere
privado da vítima Eloá, reduzo as reprimendas em 1/6, o que perfaz 04 (quatro) anos e 02 (dois) meses para o
crime de cárcere privado e 03 anos e 04
(quatro) meses de reclusão e 300 dias multa, para cada um dos crimes de disparo
de arma de fogo.
Não incidem causas de aumento de pena.
Reconhecida a tentativa de
homicídio contra Nayara, reduzo a pena no patamar mínimo de 1/3, tendo em vista
o laudo pericial juntado a fls. 678/679 e necessidade de futura intervenção
cirúrgica para reconstrução dos ossos da face, concretizando-a em 20 (vinte)
anos de reclusão.
Em relação à tentativa de
homicídio contra o policial militar Atos, aplico a redução máxima de 2/3, uma
vez que a vítima não sofreu lesão corporal, o que perfaz 10 ( dez) anos de
reclusão.
Os crimes foram praticados nos
moldes do artigo 69, do Código Penal.
Constatado que o réu agiu com desígnios autônomos, almejando dolosamente a produção de todos os
resultados, voltados individual e
autonomamente contra cada vítima, afasta-se
qualquer das figuras aglutinadoras das penas (artigos 70 e 71 do Código Penal) e reconhecendo-se o concurso
material de crimes, previsto no artigo 69, do Código Penal.
Somadas, as penas totalizam 98 anos e 10 meses de reclusão e
pagamento de 1320 dias – multa, o unitário no mínimo legal.
Para o início de cumprimento da
pena privativa de liberdade, fixo o regime inicialmente fechado. Incidem os
artigos 33, §2º, “a”, do Código Penal, artigos 1º, inciso I, e 2º, §1º, ambos da Lei nº 8.072/90, em
relação aos crimes dolosos contra a vida.
É, ademais, o único adequado à
consecução das finalidades da sanção penal, consideradas as circunstâncias em
que os crimes foram praticados, que bem demonstraram ousadia, periculosidade do
agente e personalidade inteiramente avessa aos preceitos que presidem a
convivência social, bem como as consequências de suas condutas.
As ações, nos moldes em que
reconhecidas pelo Conselho de Sentença, denotam personalidade agressiva,
menosprezo pela integridade corporal, psicológica e pela própria vida das
vítimas, o que exige pronta resposta penal. Como fundamentado na primeira etapa
da dosimetria da pena, as circunstâncias judiciais são totalmente desfavoráveis
ao réu (§3º do artigo 33, do Código Penal).
E por tais razões não é possível
a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direito ou a
concessão de sursis, diante do quantum fixado e da ausência dos requisitos
subjetivos previstos nos incisos III, do art. 44 e II, do art. 77, ambos do
Código Penal.
Saliento, ainda, a vedação
prevista no artigo 69, parágrafo primeiro, do Código Penal, bem como que as
benesses implicariam incentivo à reiteração das condutas e impunidade.
Em face da decisão resultante da vontade soberana dos Senhores Jurados,
julgo PROCEDENTE a pretensão punitiva do
Estado, para condenar LINDEMBERG ALVES FERNANDES, qualificado nos
autos, como incurso nas sanções do artigo 121, parágrafo 2º, incisos I e IV
(vítima Eloá), artigo 121, parágrafo 2º, incisos I e IV, c.c. artigo 14, inciso
II (vítima Nayara), artigo 121, parágrafo 2º, inciso V, c.c. artigo 14, inciso
II, (vítima Atos), artigo 148, parágrafo 1º, inciso IV, por cinco vezes,
(vítimas Eloá, Victor, Iago e Nayara, esta por duas vezes), todos do Código Penal, e artigo 15,
caput, da Lei nº 10.826/03, por quatro
vezes, à pena de 98 (anos) e 10 (meses) de reclusão e pagamento de 1320
dias-multa, no valor unitário mínimo legal.
O réu foi preso em flagrante
encontrando-se detido até então. Nenhum sentido faria, pois, que após a
condenação, viesse a ser solto, sobretudo quando os motivos que ensejaram o
decreto da custódia cautelar (CPP,
art.312), foram ainda mais reforçados pelo Tribunal do Júri, cuja decisão é
soberana.
Denego a ele, assim, o direito de
apelar em liberdade.
Recomende-se o réu na prisão em que se
encontra recolhido.
Após o trânsito em julgado,
lance-se o nome do réu no rol de culpados.
No mais, tendo em vista a
exibição em sessão plenária de colete à prova de balas, fato consignado em ata, artefato sujeito à regulamentação legal e específica e
em não sendo exibida documentação relativa a tal instrumento, remeta-se cópia da ata da sessão plenária ao Ministério
Público para ciência quanto ao ocorrido.
Ainda, também durante os
debates, na presença de todas as partes
e do público, a Defensora do réu Dra. Ana Lúcia Assad, de forma jocosa, irônica e
desrespeitosa, aconselhou um membro do
Poder Judiciário a “ voltar a estudar”, fato exaustivamente divulgado pelos
meios de comunicação.
Nestes termos, considerando a
prática, em tese, de crime contra a
honra e o disposto no parágrafo único do artigo 145, do Código Penal, determino a extração de
cópia da presente decisão e remessa ao Ministério Público local, para
providências eventualmente cabíveis à espécie.
Decisão publicada hoje, neste Plenário do Tribunal do Júri desta cidade,
às 19: 52 horas, saindo os presentes
intimados.
Custas na forma da lei.
Registre-se, cumpra-se e
comunique-se.
Santo André, 16 de fevereiro de
2012.
MILENA DIAS
Juíza de Direito
FONTE: UOL, em São Paulo
Publicado em 16.02.2012
Publicado em 16.02.2012