sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012

Leia a íntegra da sentença que condenou Lindemberg Alves


Depois de quatro dias de julgamento, a juíza Milena Dias proferiu, nesta quinta-feira (16), a sentença do réu Lindemberg Alves, 25. O motoboy foi condenado pela morte da ex-namorada Eloá Pimentel, 15, e por outros 11 crimes. A jovem foi mantida refém por cerca de cem horas em outubro de 2008 em seu apartamento, localizado em um conjunto habitacional de Santo André (ABC paulista).


Leia a íntegra:

Vistos.

Dispensado o relatório, nos termos do artigo 492, do Código de Processo Penal.

Submetido a julgamento nesta data, o Colendo  Conselho de Sentença reconheceu que o réu LINDEMBERG ALVES FERNANDES praticou    o crime de homicídio qualificado  pelo motivo torpe e recurso que dificultou a defesa da vítima (vítima Eloá Cristina Pimentel da Silva), o crime de homicídio tentado  qualificado pelo motivo torpe e recurso que dificultou a defesa da vítima ( vítima Nayara Rodrigues da Silva), o crime de  homicídio  qualificado tentado ( vítima Atos Antonio Valeriano), cinco crimes de  cárcere privado e quatro crimes de disparo de arma de fogo.


Passo a dosar a pena:


Deve o Magistrado, atrelado a regras de majoração da pena, aumentá-la até o montante que considerar correto, tendo em vista as circunstâncias peculiares de cada caso, desde que o faça fundamentadamente e dentro dos parâmetros legais.

A sociedade, atualmente, espera que o juiz se liberte do fetichismo da pena mínima, de modo a ajustar o quantum da sanção e a sua modalidade de acordo com a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social, a personalidade do agente, os motivos, as circunstâncias do crime, bem como o comportamento da vítima.

Pois bem.

Todas as condutas incriminadas, atribuídas ao réu e reconhecidas pelo Egrégio Conselho de Sentença incidem no mesmo juízo de reprovabilidade. Portanto, impõe-se uma única apreciação sobre as circunstâncias judiciais enunciadas no artigo 59 do Código Penal, evitando-se assim, repetições desnecessárias.

As circunstâncias judiciais do artigo 59, do Código Penal, não são totalmente favoráveis ao acusado, razão pela qual a pena base de cada crime será fixada acima do mínimo legal.

Com efeito, a personalidade e conduta social apresentadas pelo acusado, bem como as circunstâncias e consequências dos crimes demonstram conduta que extrapola o dolo normal previsto nos tipos penais, diferenciando-se dos demais casos similares, o que reclama reação severa, proporcional e seguramente eficaz. (STF - RT 741/534).

                                      Esta aferição encontra guarida no princípio da individualização da pena e deve ser realizada em cada caso concreto (CF/ 88, art.5º XLVI).

Os crimes praticados atingiram o grau máximo de censurabilidade que a violação da lei penal pode atingir.

Na hipótese vertente, as circunstâncias delineadas nos autos demonstram que o réu agiu com frieza, premeditadamente, em razão de orgulho e egoísmo, sob a premissa de que Eloá não poderia, por vontade própria, terminar o relacionamento amoroso. Tal estado de espírito do agente constituiu a força que determinou a sua ação.

                                      E, nesse contexto, envolveu não apenas tal vítima, mas também Nayara, Iago e Vitor, amigos que a acompanhavam na data em que o acusado invadiu o apartamento. Durante o cárcere privado, as vítimas, desarmadas e indefesas,permaneceram subjugadas pelo agente, sob intensa pressão psicológica, a par de agressões físicas contra todos perpetradas.        

    Durante a barbárie, o réu deu-se ao trabalho de, por telefone, dar entrevistas a apresentadores de televisão, reforçando, assim, seu comportamento audacioso e frieza assustadores. Lindenberg Alves Fernandes  chegou a pendurar uma camiseta de time de futebol na janela da residência invadida.

                                      Não posso olvidar, nesse contexto, as consequências no tocante aos familiares das vítimas.

                                      Durante o cárcere privado, a angústia dos familiares, mormente de Eloá e Nayara, que por mais tempo permaneceram subjugadas pelo réu, que demonstrava constante oscilação emocional, agressividade, atingiu patamar insuportável diante da iminência de morte, tendo por ápice os disparos que foram a causa da morte de Eloá e das lesões sofridas por Nayara.

                                      E depois dos fatos, as vítimas Nayara, Victor e  Yago sofreram  alterações nas atividades rotineiras, além de terem de se submeter a tratamentos psicológicos e psiquiátricos.

Ainda, além de eliminar a vida de uma jovem de 15  anos de idadee de quase matar Nayara e o  bravo policial militar Atos Antonio Valeriano, o réu causou enorme transtorno para a comunidade e para o próprio Estado, que mobilizou grande aparato policial para tentar demovê-lo  de sua bárbara e cruel intenção criminosa.

Os crimes tiveram enorme repercussão social e causaram grande comoção na população, estarrecida pelos dias de horror e pânico que o réu propiciou às indefesas vítimas.

Em suma, a culpabilidade, a personalidade do réu, seus egoísticos e abjetos motivos, as circunstâncias e nefastas consequências do crime impõem a esta a Julgadora, para a correta reprovação e prevenção de outros crimes, a fixação da pena, na primeira fase de aplicação, em seu patamar máximo cominada para cada delito, ou seja, 30 anos de reclusão para o crime de homicídio qualificado praticado contra Eloá; 30 anos para o crime de tentativa de homicídio qualificado praticado contra Nayara; 30 anos para o crime de tentativa de homicídio perpetrado contra a vítima Atos; 05 anos de reclusão para cada crime de cárcere privado (contra Iago, Vitor, Eloá e Nayara, por duas vezes) e de 04 anos de reclusão e pagamento de 360 (trezentos e sessenta dias multa)  para cada crime de disparo de arma de fogo (quatro vezes).

Na segunda fase, não incidem agravantes. Presente a atenuante da confissão espontânea em relação aos  crimes de disparo de arma de fogo descritos nas nona e décima séries e cárcere  privado da vítima Eloá, reduzo as reprimendas em 1/6, o que perfaz  04 (quatro) anos e 02 (dois) meses para o crime de cárcere privado e 03 anos  e 04 (quatro) meses de reclusão e 300 dias multa, para cada um dos crimes de disparo de arma de fogo.

                                               Não incidem causas de aumento de pena.

Reconhecida a tentativa de homicídio contra Nayara, reduzo a pena no patamar mínimo de 1/3, tendo em vista o laudo pericial juntado a fls. 678/679 e necessidade de futura intervenção cirúrgica para reconstrução dos ossos da face, concretizando-a em 20 (vinte) anos de reclusão.

Em relação à tentativa de homicídio contra o policial militar Atos, aplico a redução máxima de 2/3, uma vez que a vítima não sofreu lesão corporal, o que perfaz 10 ( dez) anos de reclusão.

Os crimes foram praticados nos moldes do artigo 69, do Código Penal.

Constatado que o réu agiu  com desígnios autônomos,  almejando dolosamente a produção de todos os resultados, voltados individual  e autonomamente  contra cada vítima,  afasta-se  qualquer das figuras aglutinadoras das penas (artigos 70 e 71  do Código Penal) e reconhecendo-se o concurso material de crimes, previsto no artigo 69, do Código Penal.

Somadas, as penas totalizam  98 anos e 10 meses de reclusão e pagamento de 1320 dias – multa, o unitário no mínimo legal.

Para o início de cumprimento da pena privativa de liberdade, fixo o regime inicialmente fechado. Incidem os artigos 33, §2º, “a”, do Código Penal, artigos 1º, inciso I,  e 2º, §1º, ambos da Lei nº 8.072/90, em relação aos crimes dolosos contra a vida.

É, ademais, o único adequado à consecução das finalidades da sanção penal, consideradas as circunstâncias em que os crimes foram praticados, que bem demonstraram ousadia, periculosidade do agente e personalidade inteiramente avessa aos preceitos que presidem a convivência social, bem como as consequências de suas condutas.

As ações, nos moldes em que reconhecidas pelo Conselho de Sentença, denotam personalidade agressiva, menosprezo pela integridade corporal, psicológica e pela própria vida das vítimas, o que exige pronta resposta penal. Como fundamentado na primeira etapa da dosimetria da pena, as circunstâncias judiciais são totalmente desfavoráveis ao réu (§3º do artigo 33, do Código Penal).

E por tais razões não é possível a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direito ou a concessão de sursis, diante do quantum fixado e da ausência dos requisitos subjetivos previstos nos incisos III, do art. 44 e II, do art. 77, ambos do Código Penal.

Saliento, ainda, a vedação prevista no artigo 69, parágrafo primeiro, do Código Penal, bem como que as benesses implicariam incentivo à reiteração das condutas e impunidade.

                                               Em face da decisão resultante da vontade soberana dos Senhores Jurados, julgo PROCEDENTE  a pretensão punitiva do Estado,  para condenar  LINDEMBERG ALVES FERNANDES, qualificado nos autos, como incurso nas sanções do artigo 121, parágrafo 2º, incisos I e IV (vítima Eloá), artigo 121, parágrafo 2º, incisos I e IV, c.c. artigo 14, inciso II (vítima Nayara), artigo 121, parágrafo 2º, inciso V, c.c. artigo 14, inciso II, (vítima Atos), artigo 148, parágrafo 1º, inciso IV, por cinco vezes, (vítimas Eloá, Victor, Iago e Nayara, esta por duas vezes),  todos do Código Penal, e artigo 15, caput,  da Lei nº 10.826/03, por quatro vezes, à pena de 98 (anos) e 10 (meses) de reclusão e pagamento de 1320 dias-multa, no valor unitário mínimo legal.

O réu foi preso em flagrante encontrando-se detido até então. Nenhum sentido faria, pois, que após a condenação, viesse a ser solto, sobretudo quando os motivos que ensejaram o decreto da  custódia cautelar (CPP, art.312), foram ainda mais reforçados pelo Tribunal do Júri, cuja decisão é soberana.

Denego a ele, assim, o direito de apelar em liberdade.

         Recomende-se o réu na prisão em que se encontra recolhido.

Após o trânsito em julgado, lance-se o nome do réu no rol de culpados.

No mais, tendo em vista a exibição em sessão plenária de colete à prova de balas,  fato consignado em ata, artefato  sujeito à regulamentação legal e específica e em não sendo exibida documentação relativa a tal  instrumento, remeta-se  cópia da ata da sessão plenária ao Ministério Público para ciência quanto ao ocorrido.

Ainda, também durante os debates,  na presença de todas as partes e do público, a Defensora do réu Dra. Ana Lúcia Assad,  de forma jocosa, irônica e desrespeitosa,  aconselhou um membro do Poder Judiciário a “ voltar a estudar”, fato exaustivamente divulgado pelos meios de comunicação.

Nestes termos, considerando a prática, em tese, de crime contra a  honra e o  disposto no   parágrafo único  do artigo 145,  do Código Penal, determino a extração de cópia da presente decisão e remessa ao Ministério Público local, para providências eventualmente cabíveis à espécie.

                                               Decisão publicada hoje, neste Plenário do Tribunal do Júri desta cidade, às 19: 52 horas,  saindo os presentes intimados.

Custas na forma da lei.

Registre-se, cumpra-se e comunique-se.

Santo André, 16 de fevereiro de 2012.



                                               MILENA DIAS
                                               Juíza de Direito



FONTE: UOL, em São Paulo


Publicado em 16.02.2012
Promotora diz que Lindemberg deverá ficar 30 anos preso e que recorrerá de eventual recurso


Promotora concede entrevista após julgamento: Lindemberg demonstrou "arrogância"

A promotora Daniela Hashimoto afirmou nesta quinta-feira (16) que o motoboy Lindemberg Alves deverá permanecer 30 anos preso pela morte da ex-namorada Eloá Pimentel e outros 11 crimes. Ela disse ainda que irá rebater um possível recurso à sentença a ser apresentado pela defesa.

A pena imposta ao réu foi de 98 anos e dez meses de reclusão, mas a legislação brasileira estabelece três décadas como período máximo que uma pessoa pode passar na prisão. Leia a sentença na íntegra.

Em outubro de 2008, Lindemberg manteve Eloá refém por cerca de cem horas em outubro de 2008 na casa da vítima, em Santo André (Grande São Paulo).

“Mantida a condenação e mantida essa pena, aí tem que fazer um cálculo de aproximadamente 40% que ele vai cumprir, que acaba sendo até superior aos 30 anos. Então, pelo menos os 30 anos ele permanecerá em regime fechado”, disse a promotora, que atuou na acusação durante os quatro dias de julgamento, no fórum de Santo André, na Grande São Paulo.

Sobre a possibilidade de anulação do julgamento, pedido que a advogada de defesa, Ana Lúcia Assad, anunciou que irá apresentar, a promotora disse que irá rebater. “No meu entendimento, não ocorreram (nulidades) e irei rebatê-las em eventual recurso”.
Daniela Hashimoto também comentou o anúncio feito pela juíza Milena Dias de que encaminhou ao Ministério Público uma denúncia contra a advogada Ana Lúcia Assad, por ela supostamente ter cometido um crime contra a honra ao afirmar, durante o júri, que a magistrada precisava voltar a estudar.
“Existe uma colocação de que, no calor dos debates em plenário, tudo pode ser dito. Mas eu prezo pela conduta de manter o respeito, manter a dignidade. O tribunal do júri muitas vezes é bastante questionado e criticado, justamente por essa teatralização e eu acho que foi bastante desnecessário e bastante desrespeitoso, principalmente pelo comportamento que a doutora Milene vinha adotando desde o início dos trabalhos”.

PARA PROMOTORA, DESDE O INÍCIO LINDEMBERG QUERIA MATAR ELOÁ

Arrogância do réu

Questionada sobre o réu, a promotora descreveu Lindemberg Alves como uma pessoa “manipuladora”. “Posso dizer que ele demonstrou, na ocasião do interrogatório, a personalidade que efetivamente é: uma pessoa que tentou a todo o tempo manipular os jurados, dissimular suas verdadeiras intenções e que demonstrou arrogância, demonstrou que estava bastante confortável com a situação”.
Lindemberg foi considerado culpado da acusação de homicídio doloso duplamente qualificado. Os outros 11 crimes foram duas tentativas de homicídio (contra a amiga de Eloá, Nayara Rodrigues, e contra o sargento Atos Valeriano, que participou das negociações), cinco cárceres privados (de Eloá, e três amigos: Iago Oliveira e Victor Campos, e duas vezes por Nayara, que foi liberada e retornou ao cativeiro) e disparos de arma de fogo (foram feitos quatro).



FONTE: UOL / Débora Melo - Do UOL, em Santo André (SP) / Diogo Moreira/Futura Press

Publicado em 16.02.2012 - 21h51

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

Maioria do Supremo aprova Lei da Ficha Limpa; julgamento prossegue


Sete dos 11 membros do STF (Supremo Tribunal Federal) já deram apoio à constitucionalidade da Lei da Ficha Limpa, que valerá a partir das eleições municipais deste ano. Até agora o placar é de 6 a 2.



ENTENDA A LEI DA FICHA LIMPA

A Lei da Ficha Limpa, aprovada pelo Congresso e sancionada dia 4 de junho de 2010 pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva, impede, dentre outros dispositivos, a candidatura de políticos condenados por um colegiado da Justiça (mais de um juiz).

Segundo a lei, fica inelegível, por oito anos a partir da punição, o político condenado por crimes eleitorais (compra de votos, fraude, falsificação de documento público), lavagem e ocultação de bens, improbidade administrativa, entre outros.

O STF julga duas dúvidas sobre a constitucionalidade: 1- se a lei torna inelegível quem for condenado em órgão colegiado, mesmo se ainda couber recurso; e 2 - se quem renunciou ao cargo para escapar da cassação se torna inelegível. Há divergências sobre quando começa a ser aplicada a pena. Com os votos de até agora, os condenados em órgão colegiado ficam inelegíveis e quem renunciou a cargos eletivos para escapar de cassação, também. O prazo da inelegibilidade está em discussão.

Nesta quinta-feira (16), os ministros Ricardo Lewandowski e Carlos Ayres Britto se somaram a Luiz Fux, Joaquim Barbosa, Rosa Weber e Cármen Lúcia na defesa do mecanismo que barra candidatos condenados por órgãos colegiados da Justiça. Gilmar Mendes divergiu do relator e apontou várias inconstitucionalidades, se juntando a Dias Toffoli. A sessão ainda não acabou.


Uma pessoa que desfila pela passarela quase inteira do Código Penal, ou da Lei de Improbidade Administrativa, pode se apresentar como candidato?


Ministro Ayres Britto

"A lei está em total compatibilidade com a Constituição de 88", afirmou Ayres Britto. Segundo ele, a Constituição brasileira tinha mesmo que ser mais dura no combate à imoralidade e à improbidade. “Porque a nossa história não é boa. Muito pelo contrário, a nossa história é ruim.”

De acordo com o ministro, a Lei da Ficha Limpa tem a ambição de “mudar uma cultura perniciosa, deletéria, de maltrato, de malversação da coisa pública, para implantar no país o que se poderia chamar de qualidade de vida política, pela melhor seleção, pela melhor escolha dos candidatos, candidatos respeitáveis”.

O ministro lembrou que a palavra cândido significa limpo, puro, e candidatura significa pureza ética. “Uma pessoa que desfila pela passarela quase inteira do Código Penal, ou da Lei de Improbidade Administrativa, pode se apresentar como candidato?”, questionou o ministro ao concluir seu voto pela constitucionalidade da Lei Complementar 135/2001.

Antes, Lewandowski apresentou um voto rápido. Para o ministro, a exigência de moralidade na vida pública deve se sobrepor ao direito individual de ser considerado inocente até palavra final da Justiça.

“Nós estamos diante de uma ponderação de valores, temos dois valores de natureza constitucional de mesmo nivel”, disse o ministro.


Outros votos

Para Lewandowski, ao criar a Lei da Ficha Limpa, o Congresso fez a opção legítima de aplicar o disposto constitucional que determina o zelo pela probidade administrativa e pela moralidade para exercício de mandato.

A constitucionalidade da lei só será referendada depois da proclamação do resultado. Ainda votarão os ministros Marco Aurélio de Mello, Celso de Mello e Cézar Peluso –todos esses se manifestaram contra o mecanismo em um primeiro julgamento, realizado em março de 2011, sobre se a Ficha Limpa valeria para as eleições de 2010.

No primeiro julgamento, por 6 a 5, o Supremo decidiu que a medida não era aplicável à votação de 2010 por ter sido sancionada pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva menos de um ano antes do pleito – o que é vedado pela legislação eleitoral.

Desta vez, ao contrário do que o correu no início do ano, Fux votou a favor da aplicação. Weber, que substituiu outra defensora da lei no primeiro julgamento, a ex-ministra Ellen Gracie, também deu seu apoio.

O Supremo voltou a discutir o assunto após pedido de vista do ministro Dias Toffoli, feito em dezembro. Os três processos que colocaram a vigência da lei em dúvida começaram a ser discutidos em novembro.

O primeiro de dois pedidos de vista foi feito por Barbosa, sob a justificativa de que a Corte ainda estava desfalcada de um ministro após a saída de Ellen. Weber só tomou posse neste ano.

Levada ao Congresso por iniciativa popular, a lei pesou sobre vários candidatos nas eleições de 2010. O mecanismo prevê inelegibilidade para políticos condenados na Justiça, mesmo sem decisão final, e para os que renunciaram ao cargo para escaparem de cassações. Foram os casos do ex-governador do Distrito Federal Joaquim Roriz (PSC) e dos senadores Jader Barbalho (PMDB-PA) e João Capiberibe (PSB-AP), entre outros.

Os ministros ainda divergem sobre os prazos para cumprimento da inelegibilidade. A divisão se dá sobre se a suspensão de oito anos deve se dar após uma eventual condenação final do candidato barrado ou se isso deve acontecer a partir da condenação pelo primeiro órgão colegiado.


Histórico

No voto mais esperado do julgamento, a ministra Rosa Weber afirmou que não há empecilho para que um candidato se torne inelegível antes de ser condenado de forma definitiva – exatamente conforme o mecanismo prevê. “A Lei da Ficha Limpa foi gestada no ventre moralizante da sociedade que está agora exigir dos poderes instituídos um basta”, afirmou. “Inelegibilidade não é pena. E aqui o foco é a proteção da legitimidade das eleições e da soberania popular.”

Primeiro ministro a votar contra a iniciativa, Dias Toffoli afirmou que a lei da Ficha Limpa tem a “pior redação legislativa dos últimos tempos”. Foi acompanhado por comentários de enfáticos Gilmar Mendes. “A Corte pode decidir contra a opinião popular. Se não faríamos plebiscito toda hora e alteraríamos a Constituição. A pena de morte seria aprovada. O modelo contramajoritário serve para defender o indivíduo de si mesmo”, disse.

Em seu relatório, lido no ano passado, Fux considerou problemática a aplicação da lei para casos de renúncia com objetivo de evitar cassações, mas admitiu que condenações em órgãos colegiados servem para barrar candidaturas. Depois de pedir vistas, o ministro Joaquim Barbosa endossou o abandono de cargo como critério --esse voto e o do relator ainda dividem o apoio dos defensores da lei da Ficha Limpa.

Tanto os defensores do mecanismo como Toffoli concordaram em um ponto: a lei não fere o princípio da irretroabilidade --que proíbe imputar crime a fatos ocorridos antes da confecção de uma determinada lei.



FONTE: UOL / Maurício Savarese - Do UOL, em Brasília /  (Com Agência Brasil e Agência STF)

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

CNJ pune Wider com aposentadoria compulsória


Por 12 votos a dois, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) puniu com aposentadoria compulsória, pena máxima em um processo disciplinar, o desembargador do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro Roberto Wider. A decisão foi tomada em plenário, ontem. Ele foi condenado por ter nomeado para comandar cartórios do Rio dois advogados sem a necessidade de aprovação em concurso público. Wider, que foi corregedor geral de Justiça do Rio, está afastado de suas funções desde janeiro de 2010, quando o CNJ abriu o processo administrativo contra ele.

Wider foi acusado de favorecer o lobista Eduardo Raschkovsky, de quem é amigo, em decisões judiciais e administrativas. Uma delas foi a nomeação, sem concurso, para comandar cartórios do Rio e de São Gonçalo, de dois advogados que trabalhavam no escritório do lobista. Reportagens publicadas pelo GLOBO em 2009 revelaram que Raschkovsky ofereceu blindagem a candidatos às eleições municipais do ano anterior, enquanto Wider presidia o Tribunal Regional Eleitoral do Rio, livrando-os do risco de cassação de candidatura.

A primeira tentativa de julgar o caso foi em agosto de 2011. Naquela ocasião, o relator, desembargador Fernando Tourinho Neto, defendeu a absolvição de Wider. Ele considerou a conduta do magistrado imprópria, mas ressaltou que não havia prova de que ele era amigo dos nomeados e recomendou o arquivamento do processo. Em seguida, a corregedora do CNJ, ministra Eliana Calmon, pediu vista.

"A conduta do magistrado foi incorreta, mas não consiste em falta tão grave ao ponto de justificar aposentadoria compulsória ou sua disponibilidade. E ele está afastado há um ano e sete meses. A pena correta aqui seria a de censura, mas essa pena só pode ser aplicada a juiz de primeiro grau", disse Tourinho Neto.

No mês seguinte, a ministra retornou com o caso ao plenário e propôs a pena máxima para o desembargador. O julgamento foi novamente interrompido, com pedido de vista do ministro Carlos Alberto de Paula. Na sessão de ontem, a ministra arrebanhou mais adeptos da punição máxima -inclusive o presidente do CNJ e do Supremo Tribunal Federal, ministro Cezar Peluso. Só dois conselheiros votaram pela absolvição: o relator e Silvio Rocha. Houve uma abstenção.

Após o CNJ ter afastado Wider, a defesa dele pediu ao STF para anular a decisão. Alegou que o conselho não teria poderes para instaurar processo disciplinar contra magistrado e que a decisão não teria sido baseada em "lastro probatório mínimo". O ministro Marco Aurélio Mello negou o benefício em abril de 2010, alegando que a Constituição dá ao CNJ a tarefa de "zelar pelo fiel cumprimento dos deveres funcionais dos juízes", incluindo a possibilidade de "afastamento do magistrado das atribuições que lhe são próprias" como atuação preventiva.

Quando o CNJ abriu o processo e afastou o desembargador de suas atividades, constatou que Wider feriu princípios de imparcialidade e da lealdade institucional quando nomeou dois advogados para cartórios, além de ter perseguido uma tabeliã que rompera contrato com o lobista. Desde então, Wider está sem o cargo e sem prerrogativas inerentes a ele, como carro oficial com motorista, gabinete e nomeação ou designação de servidores.

A denúncia de irregularidades supostamente cometidas por Wider foi feita em reportagens publicadas pelo jornal O Globo. A Corregedoria do CNJ colheu duas provas para sustentar a abertura do processo disciplinar: a nomeação sem concurso dos advogados Alexandre de Paula Ruy Barbosa e Carlos Roberto Fernandes Alves, para titulares, respectivamente, do 11º Ofício de Notas do Rio e 6 Ofício de Justiça da Comarca de São Gonçalo; e a fiscalização sem justa causa no 15º Ofício de Notas da capital, cuja tabeliã teria se recusado a manter o pagamento de comissão para Raschkovsky. As duas medidas foram tomadas por Wider como corregedor.


FONTE: Jornal O Globo

sábado, 11 de fevereiro de 2012

Supremo julga procedente ação da PGR sobre Lei Maria da Penha


Por maioria de votos, vencido o presidente, ministro Cezar Peluso, o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) julgou procedente, na sessão de hoje (09), a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 4424) ajuizada pela Procuradoria-Geral da República (PGR) quanto aos artigos 12, inciso I; 16; e 41 da Lei Maria da Penha (Lei 11.340/2006).

A corrente majoritária da Corte acompanhou o voto do relator, ministro Marco Aurélio, no sentido da possibilidade de o Ministério Público dar início a ação penal sem necessidade de representação da vítima.
O artigo 16 da lei dispõe que as ações penais públicas “são condicionadas à representação da ofendida”, mas, para a maioria dos ministros do STF, essa circunstância acaba por esvaziar a proteção constitucional assegurada às mulheres. Também foi esclarecido que não compete aos Juizados Especiais julgar os crimes cometidos no âmbito da Lei Maria da Penha.


Ministra Rosa Weber

Primeira a acompanhar o relator, a ministra Rosa Weber afirmou que exigir da mulher agredida uma representação para a abertura da ação atenta contra a própria dignidade da pessoa humana. “Tal condicionamento implicaria privar a vítima de proteção satisfatória à sua saúde e segurança”, disse. Segundo ela, é necessário fixar que aos crimes cometidos com violência doméstica e familiar contra a mulher, independentemente da pena prevista, não se aplica a Lei dos Juizados Especiais (Lei 9.099/95).
Dessa forma, ela entendeu que o crime de lesão corporal leve, quando praticado com violência doméstica e familiar contra a mulher, processa-se mediante ação penal pública incondicionada.


Ministro Luiz Fux

Ao acompanhar o voto do relator quanto à possibilidade de a ação penal com base na Lei Maria da Penha ter início mesmo sem representação da vítima, o ministro Luiz Fux afirmou que não é razoável exigir-se da mulher que apresente queixa contra o companheiro num momento de total fragilidade emocional em razão da violência que sofreu.

“Sob o ângulo da tutela da dignidade da pessoa humana, que é um dos pilares da República Federativa do Brasil, exigir a necessidade da representação, no meu modo de ver, revela-se um obstáculo à efetivação desse direito fundamental porquanto a proteção resta incompleta e deficiente, mercê de revelar subjacentemente uma violência simbólica e uma afronta a essa cláusula pétrea.”


Ministro Dias Toffoli

Ao acompanhar o posicionamento do relator, o ministro Dias Toffoli salientou que o voto do ministro Marco Aurélio está ligado à realidade. O ministro afirmou que o Estado é “partícipe” da promoção da dignidade da pessoa humana, independentemente de sexo, raça e opções, conforme prevê a Constituição Federal. Assim, fundamentando seu voto no artigo 226, parágrafo 8º, no qual se preceitua que “o Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações”, o ministro Dias Toffoli acompanhou o relator.


Ministra Cármen Lúcia

A ministra Cármen Lúcia destacou a mudança de mentalidade pela qual passa a sociedade no que se refere aos direitos das mulheres. Citando ditados anacrônicos – como, “em briga de marido e mulher, não se mete a colher” e “o que se passa na cama é segredo de quem ama” –, ela afirmou que é dever do Estado adentrar ao recinto das “quatro paredes” quando na relação conjugal que se desenrola ali houver violência.

Para ela, discussões como a de hoje no Plenário do STF são importantíssimas nesse processo. “A interpretação que agora se oferece para conformar a norma à Constituição me parece basear-se exatamente na proteção maior à mulher e na possibilidade, portanto, de se dar cobro à efetividade da obrigação do Estado de coibir qualquer violência doméstica. E isso que hoje se fala, com certo eufemismo e com certo cuidado, de que nós somos mais vulneráveis, não é bem assim. Na verdade, as mulheres não são vulneráveis, mas sim maltratadas, são mulheres sofridas”, asseverou.


Ministro Ricardo Lewandowski

Ao acompanhar o relator, o ministro Ricardo Lewandowski chamou atenção para aspectos em torno do fenômeno conhecido como “vício da vontade” e salientou a importância de se permitir a abertura da ação penal independentemente de a vítima prestar queixa. “Penso que estamos diante de um fenômeno psicológico e jurídico, que os juristas denominam de vício da vontade, e que é conhecido e estudado desde os antigos romanos. As mulheres, como está demonstrado estatisticamente, não representam criminalmente contra o companheiro ou marido em razão da permanente coação moral e física que sofrem e que inibe a sua livre manifestação da vontade”, finalizou.


Ministro Gilmar Mendes

Mesmo afirmando ter dificuldade em saber se a melhor forma de proteger a mulher é a ação penal pública condicionada à representação da agredida ou a ação incondicionada, o ministro Gilmar Mendes acompanhou o relator. Segundo ele, em muitos casos a ação penal incondicionada poderá ser um elemento de tensão e desagregação familiar. “Mas como estamos aqui fixando uma interpretação que, eventualmente, declarando (a norma) constitucional, poderemos rever, diante inclusive de fatos, vou acompanhar o relator”, disse.


Ministro Joaquim Barbosa

O ministro Joaquim Barbosa, por sua vez, afirmou que a Constituição Federal trata de certos grupos sociais ao reconhecer que eles estão em situação de vulnerabilidade. Para ele, quando o legislador, em benefício desses grupos, edita uma lei que acaba se revelando ineficiente, é dever do Supremo, levando em consideração dados sociais, rever as políticas no sentido da proteção. “É o que ocorre aqui”, concluiu.


Ministro Ayres Britto

Para o ministro Ayres Britto, em um contexto patriarcal e machista, a mulher agredida tende a condescender com o agressor. “A proposta do relator no sentido de afastar a obrigatoriedade da representação da agredida como condição de propositura da ação penal pública me parece rimar com a Constituição”, concluiu.


Ministro Celso de Mello

O decano do Supremo, ministro Celso de Mello, também acompanhou o relator. “Estamos interpretando a lei segundo a Constituição e, sob esse aspecto, o ministro-relator deixou claramente estabelecido o significado da exclusão dos atos de violência doméstica e familiar contra a mulher do âmbito normativo da Lei 9.099/95 (Lei dos Juizados Especiais), com todas as consequências, não apenas no plano processual, mas também no plano material”, disse.

Para o ministro Celso de Mello, a Lei Maria da Penha é tão importante que, como foi salientado durante o julgamento, é fundamental que se dê atenção ao artigo 226, parágrafo 8º, da Constituição Federal, que prevê a prevenção da violência doméstica e familiar pelo Estado.


Ministro Cezar Peluso

Único a divergir do relator, o presidente do STF, ministro Cezar Peluso, advertiu para os riscos que a decisão de hoje pode causar na sociedade brasileira porque não é apenas a doutrina jurídica que se encontra dividida quanto ao alcance da Lei Maria da Penha. Citando estudos de várias associações da sociedade civil e também do IPEA, o presidente do STF apontou as conclusões acerca de uma eventual conveniência de se permitir que os crimes cometidos no âmbito da lei sejam processados e julgados pelos Juizados Especiais, em razão da maior celeridade de suas decisões.

“Sabemos que a celeridade é um dos ingredientes importantes no combate à violência, isto é, quanto mais rápida for a decisão da causa, maior será sua eficácia. Além disso, a oralidade ínsita aos Juizados Especiais é outro fator importantíssimo porque essa violência se manifesta no seio da entidade familiar. Fui juiz de Família por oito anos e sei muito bem como essas pessoas interagem na presença do magistrado. Vemos que há vários aspectos que deveriam ser considerados para a solução de um problema de grande complexidade como este”, salientou.


Quanto ao entendimento majoritário que permitirá o início da ação penal mesmo que a vítima não tenha a iniciativa de denunciar o companheiro-agressor, o ministro Peluso advertiu que, se o caráter condicionado da ação foi inserido na lei, houve motivos justificados para isso.  “Não posso supor que o legislador tenha sido leviano ao estabelecer o caráter condicionado da ação penal. Ele deve ter levado em consideração, com certeza, elementos trazidos por pessoas da área da sociologia e das relações humanas, inclusive por meio de audiências públicas, que apresentaram dados capazes de justificar essa concepção da ação penal”, disse.

Ao analisar os efeitos práticos da decisão, o presidente do STF afirmou que é preciso respeitar o direito das mulheres que optam por não apresentar queixas contra seus companheiros quando sofrem algum tipo de agressão. “Isso significa o exercício do núcleo substancial da dignidade da pessoa humana, que é a responsabilidade do ser humano pelo seu destino. O cidadão é o sujeito de sua história, é dele a capacidade de se decidir por um caminho, e isso me parece que transpareceu nessa norma agora contestada”, salientou. O ministro citou como exemplo a circunstância em que a ação penal tenha se iniciado e o casal, depois de feitas as pazes, seja surpreendido por uma condenação penal.


FONTE: STF / RR,VP/AD

quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

Cristina Mortágua é absolvida pela Justiça do Rio


O juiz Joaquim Domingos de Almeida Neto, do 9ºJuizado Especial Criminal da Barra da Tijuca, absolveu sumariamente a ex-modelo Cristina Mortágua, durante Audiência de Instrução e Julgamento realizada nesta quarta-feira, dia 8. Ela foi denunciada por desacato à autoridade, injúria e agressão no inquérito em que a delegada de polícia Daniela dos Santos Rebelo Pinto aparece como vítima.  O conflito entre elas ocorreu no dia 7 de fevereiro de 2011, no interior da 16ª DP, na Barra da Tijuca.

Em suas alegações, a defesa da ex-modelo apresentou documento médico legal psiquiátrico informando que a denunciada encontrava-se em tratamento desde antes da época dos fatos, e que fazia uso de medicamentos, que estavam em seu poder no momento da prisão.

Segundo o magistrado, o processo se mostra inviável, tendo em vista a condição de total desequilíbrio que a ex-modelo encontrava-se no momento do fato, ficando claro que por sua condição psicológica e pelo uso de medicamentos não tinha nenhum controle de sua ação.

 “Trata-se da hipótese de absolvição sumária pela total inexistência de dolo desacatar na conduta de uma pessoa que, totalmente transtornada pela sua condição psicológica e pelo uso de medicamentos em excesso, exibe conduta imoderada, ultrapassando os limites da boa educação”, afirmou o magistrado. E concluiu: “Observe-se ainda que a própria lei penal prevê a absolvição para os casos em que a embriaguez ou uso de substância análoga não são pré-ordenadas.”

 Ainda de acordo com o juiz, a delegada Daniela Rebelo deveria, como autoridade policial que presidiu o flagrante, ter prestado atendimento a modelo, ao invés de optar pela “via fácil da lavratura do auto de prisão em flagrante”, atribuindo-se ainda a condição de vítima em resistência, desacato e crime contra a honra. “Ora, se nesse momento faltou tranqüilidade ao representante do Estado, na outra ponta da linha não se pode exigir do particular o comedimento que deveria partir da autoridade”, concluiu o magistrado.   Cabe recurso da decisão.       

Processo nº:0038127-19.2011.8.19.0001



FONTE: TJRJ

Notícia publicada em 08/02/2012 18:46

sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

Supremo decide por 6 a 5 que CNJ tem autonomia para investigar juízes


Maioria entendeu que conselho pode abrir processos contra magistrados. Ação contestava competência do órgão para fazer isso antes dos tribunais.

O Supremo Tribunal Federal decidiu por 6 votos a 5 que o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) tem autonomia para investigar e punir juízes e servidores do Judiciário. Com o resultado, perde efeito decisão liminar (de caráter provisório) do ministro Marco Aurélio Mello que reduzia a autonomia do CNJ.
Ação proposta em agosto do ano passado pela Associação dos Magistrados do Brasil (AMB) contestava a competência do órgão para iniciar investigações e aplicar penas administrativas antes das corregedorias dos tribunais.

No processo, a entidade questionava a legalidade da resolução 135 do CNJ, que regulamenta processos contra magistrados e prevê que o conselho pode atuar independentemente da atuação das corregedorias dos tribunais.

Desde quarta-feira (1º), quando a votação foi interrompida devido à primeira sessão do ano do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), os ministros decidiram debater a legalidade de cada item da resolução.
O 12º artigo da resolução, que trata exatamente da autonomia do conselho para investigar e punir, foi examinado isoladamente pela Corte nesta quinta.

“Para os processos administrativos disciplinares e para a aplicação de quaisquer penalidades previstas em lei, é competente o Tribunal a que pertença ou esteja subordinado o Magistrado, sem prejuízo da atuação do Conselho Nacional de Justiça”, diz o artigo.

Os ministros Marco Aurélio Mello, Ricardo Lewandowski, Luiz Fux, Cezar Peluso e Celso de Mello foram a favor da limitação dos poderes do CNJ, com base na invalidação desse artigo. Gilmar Mendes, Ayres Britto, Joaquim Barbosa, Cármen Lúcia, Rosa Maria Weber e José Antonio Dias Toffoli por sua vez, votaram contra.

Os ministros que saíram vencidos no julgamento admitiram que o conselho possui competência para iniciar investigações, mas destacaram que o órgão precisa motivar a decisão de agir antes das corregedorias e que essa atuação precisa ser justificável. Para a maioria do Supremo, porém, essa exigência de motivação já limitaria a atuação do CNJ.

Após o término da sessão, Marco Aurélio Mello criticou a decisão da maioria do Supremo.

“É um super órgão a quem o Supremo deu uma carta em branco. Só espero que não haja um despejo do Supremo do prédio que ele hoje ocupa”, afirmou.

Marco Aurélio Mello

Após o término da sessão, Marco Aurélio Mello, relator da matéria, criticou a decisão da maioria do Supremo. “É um superórgão a quem o Supremo deu uma carta em branco. Só espero que não haja um despejo do Supremo do prédio que ele hoje ocupa”, afirmou.

No julgamento, Mello defendeu que o trecho da resolução sobre a competência do CNJ seja interpretado em “conformidade com a Constituição”, de modo a fixar a “competência subsidiária” do conselho.

Ele também contestou o parágrafo único do artigo 12, segundo o qual as normas previstas na resolução devem ser observadas pelas corregedorias, que podem se utilizar apenas das regras internas que não estejam em conflito com as normas do conselho.

Para o ministro, os tribunais precisam ter autonomia para elaborar suas próprias normas disciplinares. “Uma vez mais, verifica-se a invasão da autonomia administrativa dos tribunais para regular o procedimento disciplinar”, disse.

O ministro afirmou que a Constituição “não autoriza o Conselho Nacional de Justiça a suprimir a independência dos tribunais”. Para ele, o objetivo final de punir magistrados, não pode justificar o descumprimento da lei.

“Como tenho enfatizado à exaustão, o fim a ser alcançado não pode justificar o meio empregado, ou seja, a punição dos magistrados que cometem desvios de conduta não pode justificar o abandono do princípio da legalidade.”

Rosa Weber

Em seu primeiro julgamento como ministra do STF, Rosa Weber votou pela manutenção dos poderes do CNJ.

“A multiplicidade e discrepância a que sujeitos os juízes em sede disciplinar atentam contra o princípio da igualdade. [...] Reclama a existência de um regramento uniforme da matéria”, afirmou. “Entendo que a competência do CNJ é originária e concorrente e não meramente supletiva e subsidiária”, concluiu a ministra.

Questionada pelo ministro Marco Aurélio Mello se a atuação do CNJ independe de motivação, a ministra afirmou: “Entendo que a atuação do CNJ independe de motivação expressa, sob pena de retirar a própria finalidade do controle que a ele foi conferido.”
A ministra defendeu ainda a atribuição do CNJ de elaborar regras relativas a procedimentos disciplinares.

Gilmar Mendes

Para o ministro Gilmar Mendes, se o STF estabelecer que o CNJ só pode atuar em caso de ineficácia das corregedorias, serão jogadas "por terra" todas as ações do conselho. “Até as pedras sabem que as corregedorias não funcionam quando se trata de investigar os próprios pares”, disse.
“Isso é um esvaziamento brutal da função do Conselho Nacional de Justiça”, complementou o ministro ao justificar que se criaria "uma insegurança jurídica" ao limitar os poderes da entidade.

Cezar Peluso

O presidente do STF, Cezar Peluso, votou no sentido de permitir que o CNJ abra investigação, mas a decisão precisa ser motivada e justificar afastamento da competência das corregedorias.
“Eu não tenho nenhuma restrição em reconhecer que o CNJ tem competência primária para investigar, mas tampouco não tenho nenhuma restrição a uma solução que diga o seguinte: 'Quando o CNJ o fizer dê a razão pela qual está prejudicando a competência do tribunal'”, disse.

Ricardo Lewandowski

O ministro Ricardo Lewandowski adiantou o voto quanto à competência do CNJ de investigar juízes e decidiu pela limitação dos poderes da entidade. Ele ressalvou que não considera a competência do conselho subsidiária, mas sim material, assim como a das corregedorias, mas disse que o órgão só pode atuar em caso de falhas nas investigações dos tribunais.

“O CNJ embora tenha recebido essa competência complementar [...] não pode exercê-la de forma imotivada, visto que colidira com princípios e garantias que os constituintes originários instituíram não em prol apenas dos magistrados, mas de todos os brasileiros”, afirmou.
Segundo ele, o exercício do CNJ “depende de decisão motivada apta de afastar a competência dos tribunais desse campo e sempre formada pelo princípio da proporcionalidade”.

Joaquim Barbosa

O ministro Joaquim Barbosa defendeu a autonomia do CNJ. “Quando as decisões do conselho passaram a expor situações escabrosas no seio do Poder Judiciário nacional vem essa insurgência súbita, essa reação corporativista contra um órgão que vem produzindo resultados importantíssimos no sentido da correição de mazelas no nosso sistema de Justiça”, disse.

Luiz Fux

O ministro Luiz Fux falou da importância do CNJ, mas defendeu que o conselho só atue quando as corregedorias se mostrarem ineficazes. “É possível o Conselho Nacional de Justiça ter competência primária e originária todas as vezes que se coloca uma situação anômala a seu ver”, afirmou.

Dias Toffoli

O ministro José Antonio Dias Toffoli, votou a favor de o CNJ atuar antes das corregedorias, sem precisar motivar sua decisão.
“As competências do conselho acabam por convergir com as competências dos tribunais. Mas é certo que os tribunais possuem autonomia, não estamos aqui retirando a autonomia dos tribunais”, disse.

Cármen Lúcia

A ministra Carmen Lúcia também defendeu que não é preciso motivação formal para que o CNJ atue de forma concorrente às corregedorias. “A competência constitucionalmente estabelecida é primária e se exerce concorrentemente de forma até a respeitar a atuação das corregedorias”, disse.

Ayres Britto

O ministro Ayres Britto votou a favor da autonomia do CNJ em investigar juízes e servidores. Segundo ele, o "CNJ não pode ser visto como um problema". "O CNJ é uma solução, é para o bem do Judiciário", disse.
Para ele, estabelecer que o CNJ só pode atuar em casos de vícios das corregedoria é como "exigir do conselho o ônus da prova".

Celso de Mello

Para Celso de Mello, o CNJ só deve atuar em caso de falhas das corregedorias dos tribunais. "Se os tribunais falharem, cabe assim, então, ao conselho investigar. Não cabe ao conselho dar resposta para cada angústia tópica que mora em cada processo", afirmou Celso de Mello.

Observações

Após o voto de Celso de Mello, o presidente do Supremo, Cezar Peluso, que já se manifestou durante o julgamento pela necessidade de o CNJ motivar eventual atuação concorrente às corregedorias, decidiu fazer "breves observações".

“A função do CNJ não é extinguir, anular, decapitar as corregedorias dos tribunais, mas remediar a deficiência de sua atuação. Portanto, me parece que, do ponto de vista do funcionamento do sistema, a questão é saber se o Conselho Nacional de Justiça voltou seus olhos para essas deficiências dos corregedores que não cumprem seus deveres”, disse Peluso.

Outros artigos

O primeiro artigo analisado pelos ministros ainda na quarta-feira foi o 2º, segundo o qual "considera-se Tribunal, para os efeitos desta resolução, o Conselho Nacional de Justiça, o Tribunal Pleno ou o Órgão Especial, onde houver, e o Conselho da Justiça Federal, no âmbito da respectiva competência administrativa definida na Constituição e nas leis próprias."

A AMB, autora da ação contra a autonomia do CNJ, questionava a legalidade do artigo pelo fato de o conselho ser definido pela Constituição como "órgão administrativo" e não tribunal.
No entanto, todos os ministros do Supremo, com exceção do presidente da Corte, entenderam que o vocábulo "tribunal" foi utilizado apenas para deixar claro que o CNJ está submetido às normas previstas na resolução.

Publicidade de processos

Os ministros também analisaram nesta quinta os artigos 4 e 20 da resolução 135 do CNJ. A AMB pediu a derrubada do artigo 4, sobre sigilo na imposição das sanções de advertência e censura aos magistrados. O artigo 20, por sua vez, estabelece que os julgamentos de processos administrativos disciplinares contra juízes será público. Para a associação, a divulgação das sessões é contrária ao interesse público, porque desacredita o Poder Judiciário.
O plenário do Supremo rejeitou os pedidos. “O respeito ao Poder Judiciário não pode ser obtido por meio de blindagem destinada a proteger do escrutínio público os juízes e o órgão sancionador”, afirmou o relator, Marco Aurélio Mello.

O ministro Luiz Fux foi voto vencido. Ele defendeu que processos disciplinares contra magistrados sejam sigilosos, para que seja respeitado o princípio da dignidade humana.
O ministro Marco Aurélio rebateu: “O sigilo é uma balela, pois a existência do processo vem a baila e passa a ser do conhecimento popular.” Para o ministro, o sigilo dá a entender, por vezes, que o delito é maior ainda do que o de fato cometido.

Regras de investigação

Os ministros também analisaram os artigos 8º e 9º. O artigo 8º diz que os corregedores e presidentes de tribunais, quando tiverem ciência de irregularidades, são obrigados a “promover a apuração imediata dos fatos”, em observância aos termos estabelecidos pela resolução.
Já o artigo 9º diz que a denúncia de irregularidades pode ser feita por qualquer pessoa, por escrito e com confirmação da autenticidade. O artigo afirma ainda que quando o “fato narrado” não configurar infração, o procedimento contra o magistrado deverá ser arquivado e o fato precisará ser comunicado em 15 dias à Corregedoria Nacional de Justiça. A maioria do Supremo manteve eficácia dos artigos, alterando apenas detalhes da redação.


Recurso

Os ministros também decidiram manter o artigo 10, que diz: “Das decisões referidas nos artigos anteriores caberá recurso no prazo de 15 (quinze) dias ao Tribunal, por parte do autor da representação.”

A AMB questionava a competência do CNJ para instituir recurso em procedimento disciplinar em trâmite nos tribunais. O relator votou pela supressão do artigo, mas não foi acompanhado pela maioria. Os ministros apenas pediram a supressão do trecho: “por parte do autor da representação”. O objetivo é garantir a todas as partes interessadas a possibilidade de recorrer das decisões dos tribunais.
Os ministros também debateram trecho da resolução do CNJ que prevê a aplicação da Lei 4.898, de 1965, a magistrados que tenham cometido abuso de poder. A maioria dos magistrados do Supremo decidiu invalidar o artigo, pois, segundo eles, em caso de abuso de poder, devem ser aplicadas as sanções previstas na Lei Orgânica da Magistratura.


FONTE: SITE G1 / Nathalia Passarinho - Do G1, em Brasília